A identidade nacional portuguesa encontra-se, ainda nos dias de hoje, latente na sociedade angolana. Desde o século XV até meados da década de 70, Angola vivenciou uma experiência colonial, sendo subserviente de Portugal. Em 1961 iniciaram-se ações pós-independentistas, de forma organizada, através de movimentos políticos nacionalistas com cariz paramilitar. Anos mais tarde, o mesmo sucedeu na Guiné-Bissau e em Moçambique, havendo em contra ataque a tentativa do Estado Novo de massificar os colonos europeus, de modo a normalizar essas ações.
Após a Revolução dos Cravos e com a proclamação da autodeterminação dos povos, a 15 de janeiro de 1975, Angola conseguiu estabelecer a sua independência. Esse dia ficou marcado pela assinatura do Acordo de Alvor, assinado entre o Governo da República Portuguesa e os partidos FNLA, MPLA e UNITA, sendo estes os três partidos políticos de maior relevo social. Todavia, no decorrer do ano de 1975, o Movimento das Forças Armadas, de forma tendenciosa, incutiu apoio a movimentos de esquerda em cada ex-colónia - no caso de Angola, apoio total ao MPLA. Enquanto o Estado Português promovia a autodeterminação dos povos, essa decisão não era de todo unânime pelos portugueses a viver em Angola, havendo resistência e ataques violentos de ambas as partes. Estes episódios fizeram com que fosse iniciada a conhecida “ponte aérea” entre Angola e Portugal, que em apenas quatro dias retirou cerca de 173 mil indivíduos de Angola. Com o avançar dos anos e no decorrer da Guerra Fria, Angola aproximou-se da URSS, devido às necessidades de sobrevivência do regime angolano, mas também face às similaridades ideológicas. Durante este período, a Guerra Civil Angolana continuava acesa, havendo sempre presente uma guerra sociológica entre o Comunismo e os defensores da Democracia Liberal. Após o fim da Guerra Fria, e com o cenário internacional mais favorável, surgiu a oportunidade de reaproximação entre Portugal e Angola, iniciada pela tentativa de democratização de Angola.
Em Maio de 1991, no Estoril, foi assinado o Acordo de Bicesse que com a hábil mediação de Durão Barroso, à data Secretário de Estado dos Assuntos Externos e da Cooperação, permitiu entendimentos entre Governo Angolano liderado por José Eduardo dos Santos e o líder do partido da oposição Jonas Savimbi (UNITA). Este acordo visava dois objetivos primordiais: terminar com a Guerra Civil Angolana e marcar eleições livres e justas no ano seguinte. Portugal era assim o mediador para a paz e pela promoção da democracia e da liberdade do povo angolano, mesmo sendo uma ex-colónia sua. De salientar, que na qualidade de observadores, constavam representantes da Rússia e dos Estados Unidos da América, por serem também beneficiários. Isto porque, precedendo este período, a Rússia financiou o partido MPLA e os Estados Unidos da América o principal partido da oposição, a UNITA. O Acordo de Bicesse não se viria a cumprir, como mais tarde o Protocolo de Lusaca, que apesar de assinado, também esse não fora cumprido. A partir de 1996 com a criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), foram estabelecidos os pilares fundamentais da relação entre Portugal e os PALOP, que se predomina até aos dias correntes na qual se inclui Angola. O “jure facto”, tendeu a privilegiar a relação do Estado português com o partido do elenco governativo angolano, neste caso o MPLA. Isto mesmo que partidariamente falando, pode ser incongruente para alguns governantes. No caso do Partido Socialista sempre existiu uma favorável relação institucional com a UNITA, por exemplo. Outro dos pilares fundamentais foi a relação fraterna entre ambos os países, que promova a “Lusofonia” através de uma cultura comum. Todavia, aquela mais visível era a do reforço das relações comerciais, havendo acordos luso-angolanas que beneficiam um regime menos burocrático.
Angola pode ser considerada a ex-colónia com maiores relações empresariais com impacto sócio-económico em Portugal, derivada da participação em setores estratégicos, como por exemplo, no sistema financeiro, nas telecomunicações e nos media. Esta intensificou-se, a partir de 2008, quando Portugal necessitou de um resgate financeiro que coincidiu com o “boom” petrolífero em Angola, sendo este último importante para que houvesse alguma liquidez no mercado português. Também nesse período, houve um crescimento massivo de portugueses a irem para Angola, havendo em 2012 cerca de 200 mil portugueses a viver em Angola.
Angola passou a ser um parceiro preferencial dos empresários portugueses, sendo o “paraíso fiscal” desejado por muitos, principalmente para a elite financeira portuguesa. Esta dinâmica terminou poucos anos mais tarde, perfazendo um interesse da justiça portuguesa a intervir em alegadas ações de branqueamento de capitais no âmbito destas relações comerciais. Nos últimos anos, principalmente desde 2017, a quando da ascensão de João Lourenço, as relações bilaterais ficaram menos estreitas, derivado igualmente de processos judiciais como o “Luanda Leaks”.
Em suma, Angola é talvez a ex-colónia preferencial da elite portuguesa, não só pelas questões financeiras, como também pelas relações políticas de grande proximidade. Apesar de Angola ser um dos maiores pólos comerciais do continente africano, Angola é um dos países onde as desigualdades sociais são mais latentes. Embora tenha havido um esforço do Portugal democrático em criar relações fortes e construtivas com Angola, a sua intervenção sempre foi muito representativa e pouco intervencionista, recatando os problemas de Angola para o Governo Angolano, seja ele ou não democrático.
Referências:
Carvalho, T. (2015). O Conflito entre MPLA e UNITA/FNLA como Materialização do Confronto URSS/EUA: no contexto da Guerra Fria. https://ubibliorum.ubi.pt/bitstream/10400.6/5906/1/4017_7803.pdf
Catarrp, P. (2011). Os Acordos de Bicesse. RTP Ensina.
Oliveira, R. S. (2021). Portugal e África. In O Essencial da Política Portuguesa
(pp. 874-891). Tinta da China.
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