top of page

Arábia Saudita: uma política externa ambiciosa para um príncipe... flexível?

Foto do escritor: Bruno LopesBruno Lopes


Que a Arábia Saudita é um importantíssimo ator global em diferentes mercados e âmbitos, é inegável. Não obstante, seu crescente protagonismo trouxe alguma surpresa a muitos no ocidente. Por trás deste intenso trabalho de reformas internas e maior protagonismo internacional está o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, regente do reino de seu pai, o rei Salman.


O reino saudita está hoje entre as 20 maiores economias do globo, mas é a nível regional que muito se destaca. Sendo o Médio Oriente uma região igualmente próspera e fraturante, a Arábia Saudita apresenta-se como a segunda maior potência militar da região (.), a maior produtora de petróleo (e segunda maior do mundo), o ouro negro, mas também tem se destacado como alguma abertura interna e externa, seguindo lentamente os mesmos passos dos Emirados Árabes Unidos.


Neste contexto, é imperioso ressaltar a atuação do príncipe herdeiro e primeiro-ministro enquanto regente. Em sua auto-intitulada “Mensagem de Liderança”, Sua Alteza apresenta, no âmbito da visão para a agenda 2030, três pilares fundamentais que guiam a governação saudita: I- manter a Arábia Saudita enquanto guardiã das duas mesquitas sagradas de Allah, sendo portanto um elemento de união entre os países árabes; II- consolidar o reino como um grande investidor global, fazendo uso do seu fundo soberano, o maior do mundo; III- fazer da Arábia Saudita e do Médio Oriente um hub de ligações e negócios que conecta três continentes: África, Europa e Ásia. A importância da política externa é, portanto, inegável.


Para tamanha abertura externa, os sauditas reconheceram que primeiramente deveriam promover reformas internas, para então serem melhor aceites em um mundo cada vez mais globalizado. Algumas mudanças passaram desde a permissão concedida às mulheres para conduzir, até a reformas fiscais, a abolição da “polícia religiosa” e mudança nas leis da família. Apesar de tais mudanças, o domínio político da Arábia Saudita permanece intacto, uma monarquia absoluta, porém com alguma flexibilidade de reforma social e cultural para atrair turistas e investidores.


Historiadores sauditas argumentam que pode-se falar em “política externa saudita” desde os últimos três séculos, tendo por base princípios religiosos e políticos conservadores que mantiveram-se inquestionáveis por centenas de anos (Saleh al-Khathlan, 2023). Por outro lado, tendo em vista o panorama mundial das últimas duas décadas, os sauditas provaram que são de facto capazes de fazer frente aos novos desafios da ordem internacional. Um grande elemento motivador foi a deterioração das relações entre Washington e Riyadh desde a administração Obama e com a administração atual sendo ainda mais delicada tendo em vista a divulgação de documentos por parte das autoridades americanas no que concerne a suposta ordem vinda diretamente do príncipe herdeiro para capturar e matar do jornalista saudita Jamal Khashoggi no consulado em Instambul.


Neste contexto, Riyadh voltou-se para novos parceiros. Por mediação da China, a Arábia Saudita iniciou conversações de paz com o Irão, que muito embora não se saiba qual o futuro dessa relação, nota-se claramente o shift diplomático a sair do eixo americano. No âmbito multilateral a Arábia Saudita confessou estar em negociações com os BRICS, sendo sua adesão ainda possível de se confirmar até a próxima cúpula do bloco. Mais surpreendente ainda, Telaviv e Riyadh mantém conversações para encontrar pontos de convergência sob uma única premissa: só haverá desenvolvimento e prosperidade se houver paz no Médio Oriente.


O caso israelita merece uma atenção especial. Aquando do forte (porém ineficaz) ataque iraniano a Israel no passado dia 13 de abril, foi divulgado que cerca de 99% de todos os drones e mísseis foram abatidos com sucesso. O que muitos não esperavam é que foram os sauditas e os jordanianos, ao lado dos britânicos e franceses, que ajudaram Israel a se defender de um ataque sem precedentes. Apesar de alguma relutância, a casa real saudita admitiu ter fornecido ajuda a Israel, o que também demonstra a visão não apenas estratégica, mas também flexível do principe herdeiro Mohammed bin Salman. Os sauditas com toda certeza que não forneceram tal auxílio meramente por bondade e desejo de paz, antes, poderão utilizar o ocorrido como barganha de maior influência aquando das negociações de paz entre Israel e os palestinianos em futuro ainda incerto. Riyadh reconhece que, apesar do início das conversações com o Irão por mediação chinesa, os iranianos também já trouxeram muito transtorno aos objetivos sauditas no Yemen, o que levou a Arábia Saudita estar mais disposta a aproximar-se de Israel do que do Irão, pelo menos a curto prazo enquanto ambos os casos ainda permanecem como uma incógnita diplomática.


Independente do que venha a acontecer nos próximos meses, Mohammed bin Salman já provou aos seus homólogos regionais e do mundo que a Arábia Saudita já não é apenas um regime absolutista e conservador, mas um regime que, apesar de absolutista, está aberto ao mundo e sedento por protagonismo.



10 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page